A pedidos, post tag-team sobre O Hobbit

Esse post vai ser consideravelmente mais longo que os meus habituais posts sobre filmes aleatórios. Isso porque O Hobbit causou um hype absurdo desde que foi anunciado, nos idos de 2007 ou 2008. Formou-se a mais absurda expectativa por filme que eu sou capaz de me lembrar e, como fãs de cinema e de Tolkien (respectivamente), eu, Luis Gelati, e o glorioso CEO do Pudim, L. Chagas, nos dirigimos ao cinema mais próximo e assistimos essa aguardada obra. Impressões a seguir. Partes destacadas são comentários do Chagas.

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                  O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (The Hobbit – An Unexpected Journey)
                  EUA
                  2012
                  Aventura
                  Aprox. 169 minutos

Bilbo Bolseiro (Ian Holm, que também interpretou Bilbo na trilogia O Senhor dos Anéis, quando velho, Martin Freeman, o Arthur Dent de O Guia do Mochileiro das Galáxias, quando novo) é  um típico membro de sua família: nunca tem aventuras nem faz nada inesperado. Um dia, repentinamente, Gandalf (Ian McKellen,  Magneto dos três primeiros X-Men, Gandalf na trilogia Senhor do Anéis, Leigh Teabing em O Código da Vinci) aparece em sua casa, oferecendo a chance de participar da companhia de Thorin Escudo de Carvalho (Richard Armitage, que fez várias séries e pouquíssimos filmes). Thorin lidera 13 anões na missão de recuperar o reino de Erebor, tomado pelo dragão Smaug há 60 anos.

Começarei com o maior problema do filme: o fato de ser o primeiro de três. O Hobbit não é uma história difícil de ser contada, e a transcrição para mídia visual facilita ainda mais. Se levarmos em conta que o livro é sensivelmente menor que As Duas Torres, por sua vez o menor da série O Senhor dos Anéis, temos a nítida impressão de que fazer uma trilogia é uma tentativa excessiva de Peter Jackson de se consolidar como diretor de épicos (ou, pior um pouco, de arrancar trocados dos fãs). Dois filmes poderiam ser necessários, mas três é abuso.

É verdade, acho também que três é abuso, tudo bem que é a bíblia tolkeniana (é como se O Silmarillion e  The Book of Lost Tales – Contos Inacabados – fossem o velho testamento, mas O Hobit é o que conta), mas realmente acho que um filme de umas quatro horas estava de bom tamanho,  e se a desculpa era de fazer jus à importancia do livro que fizessem o roteiro um pouco menos distante. Radagast ficou, na minha humilde opinião uma boníssima adição, mas bem menos brilhante foi o orc branco…

Quando ao critério fidelidade, me nego a comentar muito. Nunca li nada de Tolkien. E mesmo que tivesse lido, é besteira pensar que um “filme do livro” deve ser fiel ao livro. São mídias diferentes, muitas coisas funcionam em uma e não funcionam na outra. Uso como exemplo a série Harry Potter, que funcionou infinitamente melhor no cinema. Sei que os nomes dos personagens são os mesmos, sei que a letra de Far Over the Misty Mountains foi apenas abreviada (porque a original tinha 27 versos) e é isso que eu sei.

As canções ficaram muito fodas, eu realmente não acho qualquer defeito nelas. Mas falando de fidelidade, o encontro do Baggins e Golúm ficou exatamente como eu imaginava das vezes que li. Na verdade a “caverna” ficou um pouco menos escura, mas isso é o de menos. Foi sem dúvida o que mais gostei do filme todo, junto à  reunião dos anões e That’s what Bilbo Baggins Hates.

raddieParte visual impecável. Erebor provocou orgasmos visuais, a maquiagem ficou orgânica (embora Fili, Kili e Thorin tenham ficado, na minha opinião, bonitões demais pra convencer como anões), as roupas e os equipamentos são belos e convincentes (com a Orcrist superando a Sting no meu rank de espada mais bonita da série). O 3D é satisfatório, mas desnecessário. Não sou fã de 3D e duvido que alguém que use óculos goste da sensação de usar dois ao mesmo tempo. Não direi nada sobre os 48 frames por segundo porque não existe essa tequinulugia aqui no Melhor Mato Grosso.

LOL, “Melhor Mato Grosso”. ¬.¬ …  Mas então, Thórin ficou mesmo pouco anão, Kili incomoda, o 3D é de fato desnecessario e eu prefiro machados, mas não acho que precisemos de 48FPS pra apreciar a estética desta obra. Melhor Mato Grosso….. To rindo muito aqui.

Trilha sonora, simplesmente perfeita. As duas canções que os anões cantam (That’s what Bilbo Baggins Hates e Far Over the Misty Mountains) são bem arranjadas, usam a letra original do livro e, apesar de serem completamente desnecessárias para o prosseguimento da história, não chegam a incomodar. As menções pontuais ao tema do Um Anel formam um ponto que eu achei particularmente inspirado.

Como já comentei, ficaram impecáveis, e ajudam a tirar o peso do arrastamento da parte chata da estoria, e ficaram boas mesmo (sim estou sendo repetitivo, mas é que ficou bom).

O desenrolar da história foi prejudicado pela divisão em 3 filmes. Foi necessário inventar um sub-vilão (Azog, o orc albino, que é citado em um dos apêndices de O Senhor do Anéis e, aqui, é promovido a antagonista) para que o filme não se tornasse arrastado, mas eu preferiria um filme arrastado a um conflito artificial. Azog seria muito melhor aproveitado se sua importância começasse e acabasse na cena que explica o apelido de Thorin Escudo de Carvalho. Não achei as participações de Radagast, o Castanho (Sylvester McCoy, outro ator de muitas séries e poucos filmes), tão irritantes quanto alguns, que inclusive citaram-no como “o Jar Jar Binks do Peter Jackson”. Achei, inclusive, muito acertado que um mago das florestas possua aparência excêntricaImagetgtgvtvttvtvtv nível Ventania e um comportamento quase tão estranho quanto. A cena com Saruman, por sua vez, nada adiciona, embora a atuação de Christopher Lee esteja tão sólida quanto é possível. O mesmo vale para Galadriel (Cate Blanchett, de O Curioso Caso de Benjamin Button e O Aviador). Cena vazia, atuação boa o suficiente pra cena não incomodar.

Azog não tirou o peso do filme como deveria e o fato de ele ainda estar vivo em O Hobbit (não deveria) me faz perder a esperança de Bolg, filho dele e esse sim antogonista em O Hobbit, aparecer. Quanto ao Jar Jar eu curti pra caramba, só acho que o lance de ele ser amigo dos pássaros foi interpretado errado; Já o branquelo do orc realmente podia ter parado de aparecer depois da cena da Guerra dos Anões (que já é “fantasiosa demais” comparada ao livro, não foi daquele jeito que aconteceu, mas ficou bom). O conselho de Galadriel e Saruman (que sabemos que havia acontecido quase ao mesmo tempo em que Smeagol achava o anel) acho que foi inserido no filme pra, mais na frente, fazer um gancho pra mais uma aparição do mago marrom, pra poderem retratar alguma proximidade dele a Gandalf (que chega a chamá-lo de parente algumas vezes, nos apêndices), já que é ele usado pelo Branco pra fazer Mirthrandir meter os pés pelas mãos (e depois o salvar) na Guerra do Anel, mas isso já é outra estória.

Concluindo o post, vale o ingresso. Um consistente 7/10, dando um bom pontapé inicial na história. Entretanto, se o nível não subir no próximo filme, tenho minhas dúvidas de que assistirei o terceiro no cinema.

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Documentário: Mosaicos – A arte de Chico Science

Bom dia, boa tarde, boa noite. Encontrei esse documentário e acho extremamente válido compartilhar com os leitores. Sem mais delongas, aproveitem.

 

Até outro dia desses

 

Luis Gelati

@gelati_dm


E nada novo na Casa Branca

 

Como vocês podem ver pela expressão, nosso mascote gostou muito do post sobre a Nana Gouvêa. Mas não podemos esquecer que, além de malandrão, ele é o mais novo presidente reeleito dos Estados Unidos. Odiadores odiarão, apoiadores apoiarão, e continuaremos utilizando ele como nosso garoto propaganda. Boa, moreno, faz teu nome.

Até breve, obrigado pelos peixes

Luis Gelati

@gelati_dm


Pseudo-resenha pseudo-crítica pseudo-”gostei pra caramba e tenho meus motivos”: O Profissional

O Profissional (Leon)
França
1994
Crime Drama
Aprox. 132 minutos (versão extendida)

Léon (Jean Reno, de Wasabi, Ronin, O Código da Vinci, Flyboys, enfim, vocês sabem de quem se trata) é esse assassino (ou “faxineiro”), que se vê quase obrigado a abrigar Mathilda (Natalie Portman, de V de Vingança, Cisne Negro e Episódios I, II e III de Star Wars) depois que a família dela é morta por um grupo de policiais corruptos, chefiados por Stansfield (Gary Oldman, de Drácula de Bram Stoker, O Quinto Elemento, trilogia Batman do Nolan, Harry Potter do terceiro pra frente). Ela não tem pra onde ir, e insiste em permanecer com Léon e aprender o “ofício”. Os dois se aproximam gradualmente (e sem maldade alguma), e isso acaba (obviamente) derretendo o costumeiramente frio e “profissional” Léon.

A primeira coisa que me impressionou nesse filme foi a força da atuação de Natalie Portman. Não consigo entender como uma atriz estreante de 12 anos de idade conseguiu ser tão convincente ao intepretar um personagem forte e perturbado como Mathilda. A única vez que vi algo parecido foi em Entrevista com o Vampiro (Kirsten Dunst, 11 anos, interpretando Claudia, uma vampira de décadas de idade com o corpo de uma criança). Mathilda assume uma postura “dominadora” na relação, aparentando, em alguns momentos, ser tão (ou mesmo mais) adulta que Léon. No entanto, sendo uma criança sem pai ou mãe válidos, com referência alguma fora a televisão, ela parece confundir o amor de pai ou de irmão (muito) mais velho com amor romântico. Isso gera uma curiosa relação de lolita inversa, onde quem parece querer algo é a lolita. Isso é muito melhor explorado na versão que eu assisti (International Cut), cujos vinte minutos a mais são quase inteiramente dedicados à relação Léon-Mathilda.

Jean Reno, especializado em fazer papel de badass (embora, em geral, o badass interpretado seja francês, não italiano), não decepciona. Transmite verossimilhança em cada momento, seja de frieza, de alegria, de raiva ou de medo. Léon é uma pessoa simples e comum, apesar de ser um assassino de aluguel. E é um assassino frio e eficiente, apesar de ser uma pessoa simples e comum. As cenas dele ensinando o ofício chegam a ser comoventes. É exatamente a mesma coisa que assistir um pai ensinando a filha a andar de bicicleta. Mas com armas.

Stan, por fim, é um antagonista tão eficiente quanto poderia ser. Gary Oldman, ator consagradíssimo, cria um personagem multifacetado, sendo um policial de narcóticos corrupto, viciado em drogas, com uma facilidade imensa a ir da calma fria à raiva insana em espaços de menos de um minuto. Discutindo Beethoven com alguém que ele vai matar em breve. Conversando calmamente com alguém que está lá com a intenção de matá-lo.

A ambientação do filme é eficiente em sua escolha de possuir praticamente só ambientes fechados, gerando a nítida impressão de que os personagens “não tem pra onde fugir”. A trilha sonora é adequada. Quanto à trilha sonora, notei algo que eu nunca tinha percebido e não sei dizer se é exclusividade desse filme ou se é costume: algumas das cenas sem música aparentemente usam isso como recurso. A falta de música cria uma expectativa, um clima de “não completude”.

Nas mãos erradas esse roteiro teria sido um filme genérico de ação (como aconteceu, recentemente, com Os Substitutos). Felizmente, nasceu um drama extremamente emocional disfarçado de “crime movie”. Elenco excelente, equipe eficiente, temos um filme sólido que, por mérito próprio, se tornou um clássico.

Até outro dia desses

Luis Gelati

@gelati_dm


Pseudo-resenha pseudo-crítica pseudo-”gostei pra caramba e tenho meus motivos” cinematográfica: Corra, Lola, Corra

Corra, Lola, Corra (Lola rennt)
Alemanha
1998
Crime Thriller
Aprox. 81 minutos

 

 

 

São 11:40 da manhã. Manni (Moritz Bleibtreu, que interpretou o Fantasma Cinzento em Speed Racer e é o dublador em língua alemã de Flynn Rider, de Enrolados) liga para sua namorada Lola (Franka Potente, Maria na série Bourne, Tania em Che – O Argentino). Ele fez alguma coisa ilegal envolvendo algumas Mercedez que o rendeu uma quantia considerável de diamantes. Lola, que “sempre chega no horário”, deveria estar lá para pegá-lo depois que os diamantes foram convertidos em dinheiro. Infelizmente a lambreta dela foi roubada enquanto ela comprava cigarros. Ela não conseguiu chegar a tempo, ele resolveu ir para casa de metrô. Coisas dão errado e ele precisa arranjar 100 mil Marcos (espero que todos os leitores deste fidalgo sítio saibam que o Marco é a moeda alemã), caso contrário terá problemas seríssimos com um chefão do crime (Heino Ferch, Albert Speer em A Queda – As últimas horas de Hitler). Pequeno detalhe: ele precisa entregar esse dinheiro até o meio-dia. Caso Lola não consiga o dinheiro, a solução que ele encontra é assaltar o mercado que se encontra na frente da cabine telefônica em que ele está. Lola fala para ele esperar por ela até meio-dia (lembrando que ela “sempre chega no horário”). Pensa em todas as pessoas que poderiam possivelmente arranjar esse dinheiro e lembra de seu pai (Herbert Knaup, que aparentemente só fez filmes alemães. Fico devendo um papel que eu conheça). O que ela faz em seguida? Corre.

Pronto, contei os primeiros dois minutos de filme. Os outros 79 (ok, menos, tem os créditos finais) são ridiculamente agitados. Esse filme simplesmente não para um segundo, e os contantes cortes e edições (as cenas duram, em média, 2.7 segundos entre um corte e outro) ajudam a estabelecer uma atmosfera muitíssimo eficiente. Aparentemente feito pelos lulz, esse filme joga com a mesma idéia de Efeito Borboleta, mas de forma ao mesmo tempo mais sutil e mais brusca. Os mínimos detalhes provocam alterações enormes nos eventos. Alterações grandes o suficiente para que o filme seja dividido em três partes, cada uma delas começando do momento em que Lola desliga o telefone.  Ela desce as escadas correndo, encontra um moleque com um cachorro e, a partir daí, cada “corrida” se torna uma história diferente. Ela visita os mesmos lugares e encontra as mesmas pessoas, mas as coisas acontecem de forma diferente em cada um desses lugares e, mais importante, com cada uma dessas pessoas. Virando a esquina de casa, o caminho de Lola se cruza com o de uma mulher com um carrinho de bebê. O fato de elas se trombarem ou não determina, como nos mostra uma rápida sucessão de fotos intantâneas que piscam na tela e somem como se nada tivesse acontecido, se ela vai ganhar na loteria, se tornar uma católica fervorosa ou ter a criança tomada pela Assistência Social. Essa mesma situação se repete com mais cinco ou seis personagens, em um efeito de narrativa que, por si só, é um excelente motivo para assistir esse filme. Algo interessante é que não se sabe se aparentes momentos de diálogo entre as histórias (dois momentos envolvendo a trava de segurança de uma pistola, por exemplo) são meras coincidências ou algo como “lembranças”.

Não tenho nem idéia de quanto foi o orçamento da obra, mas ela é, sem dúvida, bem executada. Atores competentes, locações ótimas e, parênteses subjetivos, uma trilha sonora que parece ter sido feita por encomenda, com cada música se encaixando perfeitamente na cena em que aparece. O roteiro não passa nem perto de ser ruim, mas acaba sendo obscurecido pela execução do projeto. Creio que poucas pessoas realmente vão prestar atenção na história do filme quando existem paradoxos, linhas do tempo paralelas e uma ruiva correndo desesperadamente. Achei os títulos traduzidos de uma imbecilidade ímpar. “Corra, Lola, Corra” parece nome de filme de Sessão da Tarde, assim como Run, Lola, Run. O original em alemão é muito mais vago e muito mais interessante, por despertar a curiosidade. O que acontece no filme? “Lola corre”.

A única coisa que desabona esse filme é o fato de, com certeza, quase ninguém prestar atenção na idéia, uma vez que a execução a ofusca. Tendo em vista o público alvo deste blog, espero que vocês não cometam esse erro. Assistam e, se puderem, respondam Às perguntas deixadas. Algum dos finais é “o certo”? Se sim, qual? O filme todo é, na verdade, Lola pensando no que fazer? E a mais importante de todas: quantos quilos Franka Potente perdeu durante as filmagens?

Valeu pela atenção dispensada, um dia eu volto

 

Luis Gelati

twitter.com/gelati_dm

 


Feliz Dia de São Patrício

 

Beba, seja feliz e corra nu pela pradaria mais próxima.


Pseudo-resenha pseudo-crítica pseudo-“gostei pra caramba e tenho meus motivos” cinematográfica: Curtindo a vida adoidado

Bom dia, boa tarde, boa noite leitores do Pudim de Ameixa. Ultimamente eu tenho assistido vários filmes clássicos que, por um motivo ou outro, eu não assisti até hoje. Dessa vez o escolhido foi um épico adolescente de Sessão da Tarde. Sem mais delongas.

 

Curtindo a vida adoidado (Ferris Bueller’s Day Off)
EUA
1986
Comédia
Aprox. 98 minutos

 

O filme abre estabelecendo Ferris Bueller como personagem: assim como, por exemplo, Han Solo, ou as versões cinematográficas de Tony Stark e Sherlock Holmes (e provavelmente o próprio Robert Downey Jr.), Ferris Bueller é  um “scoundrel”, um cara que não presta, mas não presta com tanto carisma que você acaba se afeiçoando a ele. Em três minutos de filme temos a quatro características mais marcantes dele como personagem, nominalmente uma inteligência afiadíssima, uma falta absoluta de vergonha na cara, o fato de todo mundo (e ao longo do filme isso é levado a extremos cômicos) não apenas o conhece como o adora e a mais marcante de todas, o “foda-se”. Esse filme é um ode ao “foda-se”, em sua forma mais pura.

O roteiro é simples: Ferris (Matthew Broderick, no único papel realmente bom que eu consigo me lembrar)decide aproveitar um dia de primavera do jeito certo, ao invés de desperdiçá-lo na escola. A partir daí, cria um plano gigantesco (e comicamente impecável, não há um único furo no plano ao longo de quase duas horas de filme) para convencer seus pais de que está doente e resolve sair pela cidade, junto com seu melhor amigo Cameron (Alan Ruck) e sua namorada Sloane (Mia Sara), para aproveitar um dos últimos dias antes de terminar o ensino médio e ir para a faculdade, se separando dos dois.. As formas deliberadamente escrachadas que Broderick confere ao personagem, quebrando a quarta parede com frequência e transmitindo uma atitude de “relaxa, eu sei o que estou fazendo” contrastam com os dois “antagonistas” do filme: Edward Rooney (Jeffrey Jones), o responsável por manter os alunos da escola em que Ferris estuda “na linha” e Jeanie (Jennifer Grey, que me surpreendeu com sua atuação, provavelmente porque o único outro filme dela que eu conheço é Dirty Dancing e o fato de minha mãe ter assistido ele milhões de vezes me fez pegar uma certa raiva), irmã (creio eu que) mais velha de Ferris. Os dois citados são os dois únicos seres humanos da cidade INTEIRA (e, caso eu não tenha mencionado, trata-se de Chicago) que percebem que Ferris Bueller é um gigantesco safado. Jeanie transmite isso através de um ódio patológico pelo irmão e por qualquer um que faça a ela o favor de lembrar que ele faz tudo o que quer e nunca tem problema algum com isso. Já Rooney mostra isso estando determinado a desmascarar Ferris e reprová-lo por faltas, o que fará com que ele fique mais um ano no ensino médio ao invés de ir para a faculdade.

Conforme eu disse, esse filme é um ode ao foda-se, ao hakuna matata, ao carpe diem ou a qualquer outra forma de “viva a vida porque ela é curta”. O melhor amigo de Ferris, Cameron, se torna um personagem importante na história justamente por ser ridiculamente neurótico, o mais oposto à atitude de Bueller que é possível ser. Ele vê problemas em tudo, se preocupa com tudo, pensa seis vezes antes de fazer qualquer coisa. Vemos que um dos objetivos de Ferris (além de aproveitar o dia, claro) é ajudar seu amigo a se preocupar menos, a viver mais relaxado. Um objeto que representará a evolução de Cameron ao longo do filme será a Ferrari de seu pai, que só sai da garagem depois de muito bico doce por parte do protagonista.

Sloane é um personagem um tanto apagado, na minha opinião, mas tem seus momentos. Ela seria algo como uma “side sidekick”, uma segunda cúmplice. Tem seu charme, a atriz é definitivamente muito bonita, mas não consegui ver nela um peso tão grande quanto o de Cameron. Seria, obviamente, muito difícil ter dois “coadjuvantes quase protagonistas”, mas ela é muito menos relevante que Cameron, e isso é visível na cena em que Cameron entra em estado catatônico.

Jeanie é outro personagem neurótico, mas de outra forma. Ela cria uma revolta tão grande quanto às ações do irmão que deixa de viver a própria vida. A picuinha irmão-irmã poucas vezes foi tão bem interpretada ou resolvida de forma tão interessante. Este é outro personagem que passa por um desenvolvimento claro, embora muito mais brusco (numa cena hilária com participação de Charlie Sheen). Aparentemente Ferris Bueller tem uma atitude tão relaxada quanto à vida que consegue ser um missionário do “relaxa e goza”, mesmo sem querer.

O filme foi concebido como um tributo à cidade de Chicago. Assim sendo, não havia como as locações serem tão cuidadosas quanto foram. Museu, bolsa de valores, uma parada, tudo isso é mostrado e incorporado na história de forma orgânica, somando ao brilho do filme sem ofuscá-lo (como ocorreu no fraquinho Canguru Jack, por exemplo, em que você assiste uma coleção de panorâmicas da Autrália e ganha um enredo falho de brinde). A parte técnica é competente, o que é compreensível pelo orçamento folgado.

Esse é um daqueles filmes que vale a pena ter em DVD. Um entretenimento leve e sem compromisso que passa longe de ser vazio, é o tipo de coisa que é raro ver hoje em dia. Recomendo fortemente que seja assistido pelo menos duas vezes: uma pra rir e uma pra pensar.

 

Sem mais, até outra hora

 

Luis Gelati

twitter.com/gelati_dm

 


Sobre homossexualidade e psicologia, ou “porque apreciar estrovengas vascularizadas não é doença”.

Bom dia, boa tarde, boa noite caros frequentadores do nosso glorioso Pudim. Ultimamente muito tem sido falado sobre um projeto apresentado na Câmara dos Deputados pela chamada bancada evangélica que torna obrigatório ao psicólogo CURAR (a palavra é essa) qualquer HOMOSSEXUAL (a lei fala especificamente) que peça tal coisa. Isso vem na rabeira da recém-adquirida popularidade de Marisa Lobo, uma “psicóloga” (aspas indispensáveis, assim como quando se chama um Fiat 147 de “carro” ou Skol de “cerveja”) que utiliza, em sua profissão, uma carga de “Jesus salva” bem acima do que o bom senso e o código de ética do Conselho Federal de Psicologia recomendam. Antes que alguém toque nesse assunto, não, eu não sou ateu, agnóstico ou anti-deísta. Só sou um futuro profissional de uma área que recebe, diariamente, críticas e pitacos de quem não tem nem de perto o conhecimento necessário para criticar e dar pitacos válidos. Esses pitacos são oriundos de diversos segmentos, desde neurocientistas e psiquiatras até filósofos, passando por encanadores, eletricistas, balconistas de bar e pastores evangélicos. Em outras palavras, todo mundo parece ter a plena convicção de que sabe mais sobre psicologia do que alguém que passou cinco anos estudando, bem, PSICOLOGIA. Não me aprofundando nesse assunto, irei ao assunto prometido no título.

Primeiramente, uma pergunta. Você, leitor, gosta de macarrão? Sim? Desde quando? Não? Descobriu que não gostava quando? Respondidas todas estas, a pergunta que representa a cereja do bolo. Por quais motivos você gosta ou não de macarrão? Não quero um ou dois, mas todos. Todos mesmo. Cada um deles, sem deixar escapar. Agora, substitua, nas perguntas anteriores, a palavra “macarrão” pela palavra “vaginas”. O efeito é precisamente o mesmo. Até hoje não existe nenhum psicólogo ou teoria psicológica que esteja remotamente perto de descobrir todos os motivos que originam características como gosto musical, para comida, para roupas ou para parceiros de coito. Sem conhecer as origens, nada de descobrir formas de reversão. Portanto, senhores, a revelação bombástica é que nós não estamos “escondendo a cura”. Não existe essa “cura”, e não vai existir tão cedo.

Suponhamos, agora, que a “cura” seja descoberta. Por que motivos alguém procura ajuda profissional para se livrar de um comportamento? Obviamente, porque os contras superam os prós. Agora, quais são os contras que uma determinada orientação sexual poderia trazer? Um, e apenas um: falta de aceitação social. Em outras palavras, o único possível motivo que alguém teria pra querer “deixar de ser gay” é a pressão gerada pelo preconceito. Dessa forma, o que deveria ser tratado como doença, a sexualidade de um indivíduo ou a intolerância do outro, levando em conta que a citada intolerância tem como única consequência os prejuízos gerados para o primeiro indivíduo?

Por fim: o preconceito citado é calcado em algum motivo sólido? Aparentemente a única base que eles possuem é a boa e velha “picuinha”. Tenha suas picuinhas à vontade, mas não tente fazer uma lei e atropelar um código de ética com base nelas. A orientação sexual de um indivíduo muito dificilmente trará prejuízo a outro indivíduo. Em termos chulos e diretos, no orifício anal de quem a manjaroba está entrando?  No seu ou no dele? Assim sendo, porque é o seu bumbum que parece estar doendo, caro odiador?

Uma vez que a homossexualidade não gera mal estar, não atrapalha o indivíduo nem o torna inapto a qualquer ação cotidiana, não existe motivo para considerar que ela seja uma doença. Exceto, é claro, se o critério utilizado for o ponto de vista do indivíduo preconceituoso, o que eu espero que só aconteça quando eu estiver indisponível para consulta.

Sem mais, grato pela atenção.

Luis Gelati

twitter.com/gelati_dm


Pseudo-resenha pseudo-crítica pseudo-“gostei pra caramba e tenho meus motivos” cinematográfica: Durval Discos

Há algum tempo eu pensava em fazer um post criticando (no sentido de avaliação, por favor, nada de “isso é uma merda” sem argumentos palpáveis) alguma coisa. Essa idéia estava inativa até precisamente as 9:29 de hoje. Resolvi reativá-la porque, sinceramente, eu nunca assisti um filme tão poderoso quanto Durval Discos. Nenhum filme, na minha vida inteira, me deixou tremendo, cambaleante, sem saber o que dizer. Isso até a manhã de hoje.

Durval Discos
Brasil
2002
Drama
Aprox. 93 minutos

 

A base do roteiro: Durval vive com a mãe em uma casa visivelmente antiga. Anexa a essa casa está sua loja, a tal Durval Discos. Essa loja sofre para acompanhar o mercado da época (o filme se passa em 1995), uma vez que Durval se recusa a trabalhar com CD. O espectador é levado a crer que o filme será leve, descontraído, idéia reforçada pela ótima abertura em plano-sequência, pelo clima da própria loja, pela trilha sonora. Isso se mantém até mais ou menos metade do filme. Eis que começa a trama real, que transforma esse filme, repentinamente, no thriller mais eficiente que eu já assisti na vida. Não que eu tenha assistido muitos thrillers.

O filme trabalha, desde o começo, com a fragilidade e a senilidade da mãe de Durval. Ela é uma senhora de seus visíveis oitenta e muitos anos (nota posterior: a atriz tinha 71 na época da filmagem, sou péssimo em estimar idades devido ao fato de minha família ter o costume de aparentar dez anos a menos), e o filme joga com esse fato. A coisa que mais me dá agonia nesse mundo é a senilidade. E, coincidentemente, Dona Carmita é isso ao extremo. Eu sinceramente tremi o filme inteiro, com medo do momento em que ela cairia da escada ou teria um infarto fulminante. Somado a isso, o fator “não tenho idéia do que pode acontecer em seguida”. Resultado? Cu na mão. Quarenta e cinco minutos com o cu na mão.

A parte técnica é um tanto precária. Ok, sinceramente, é péssima. As locações, particularmente, são terríveis. A única que cumpre bem seu papel é a loja em si. A câmera, em alguns momentos, parece estar sendo carregada por alguém que está correndo. Esses enquadramentos criam um tom amador que torna uma cena forte mais branda, quase conferindo tom de brincadeira. A trilha sonora é uma atração à parte. O melhor do old but gold, com direito a chiados de vinil. Simplesmente lindo.

Sei que 90% dos que assistirem não terão a mesma sensação de angústia que eu tive assistindo esse filme. Muitos provavemente acharão o filme clichê. Isso porque o terror é algo essencialmente individual. Esse, para mim, foi um filme de terror, acreditem ou não. Ele trabalha com meu maior medo, o medo de ficar ou ver alguém que eu conheça ficando senil. Só o que eu sabia sobre esse filme era o título e a recepção, em geral, positiva que ele recebeu. Foi uma grata surpresa. Me abalou de forma inacreditável, mas foi grata. Assistindo Durval Discos eu, de repente, me vi no meio de uma situação inacreditavelmente tensa. Baixei esperando rir, talvez pensar, e consegui um mindfuck. Creio que o que tornou a experiência tão marcante foi, justamente, o fator “não esperaria por isso nunca”.


Boa noite, doce príncipe.

E hostes de calcinhas cantem a ti em teu descanso.